As gigantes da tecnologia estão numa briga contra o tempo. Não, elas não concorrem entre si para lançar uma ferramenta inovadora neste caso. Na verdade, Google, Amazon, Microsoft, Meta se juntaram para tentar acabar com o segundo bissexto, quando se acrescenta um segundo extra aos relógios do mundo todo para sincronizá-los com a rotação da Terra.
Para os serviços que dependem da internet — como temporizadores, agendas, banco de dados — esse acréscimo de tempo tem potencial de gerar erros (bugs), derrubar sites, interromper sistemas, entre outros problemas, segundo argumentam as big techs. Isso acontece porque as máquinas não conseguem decodificar essa conta.
Junto com as empresas de tecnologia, as agências governamentais Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia (NIST), dos EUA, e o Escritório Internacional de Pesos e Medidas (BIPM), da França, defendem que o acréscimo desse segundo é inútil. Além disso, a velocidade de rotação da Terra não teve maiores alterações ao longo dos anos, que pudessem justificar sua necessidade.
“Introduzir novos segundos bissextos é uma prática arriscada que faz mais mal do que bem, e acreditamos que é hora de introduzir novas tecnologias para substituí-lo”, afirmaram Oleg Obleukhov, engenheiro de produtos da Meta, e o pesquisador científico Ahmad Byagowi, em postagem no blog da empresa na segunda-feira (25).
Por que o segundo bissexto surgiu?
Há muitos anos, ficou convencionado que o dia na Terra seria determinado pela rotação do globo sobre seu próprio eixo e sua órbita ao redor do Sol. É o que chamam de dia solar.
Para definir e cronometrar o tempo, o Tempo Universal Coordenado (UTC) foi criado. Ele rege os relógios do mundo todo. O nosso conceito de tempo na Terra — ou espaço de tempo — é uma fração do dia solar (uma hora, por exemplo, é uma fração do dia solar).
Mas, historicamente, a taxa de rotação da Terra não é tão precisa quanto os números do relógio. O processo pode acelerar e desacelerar, de acordo com diversos fatores. Sendo assim, o tempo solar e o tempo universal coordenado dos relógios criam uma diferença ao longo dos meses.
Em 19 de julho de 2020, por exemplo, o planeta completou sua rotação 1,4602 milésimo de segundo mais rápido que os costumeiros 86.400 segundos (24 horas).
E é para compensar essa diferença que o segundo bissexto (também chamado de segundo adicional ou segundo intercalar) é usado. Desde 1972, quando começou a funcionar, as autoridades de cronometragem adicionaram 27 vezes o segundo adicional ao relógio global, conhecido como Tempo Atômico Internacional (TAI).
Em vez de 23:59:59 mudar para 0:0:0 à meia-noite, um 23:59:60 extra é inserido. Geralmente, essa atualização é feita no dia 30 de junho ou no dia 31 de dezembro.
Ao fazer esse processo, os computadores ficam confusos. Eles trabalham com a ideia de 24 horas em um dia, 60 minutos em uma hora e 60 segundos em um minuto, resume o site The Verge.
Polêmica não é nova
Pelo menos desde 2012, a luta contra o segundo bissexto ganha mais argumentos. Naquele ano, falhas foram registradas em serviços como o navegador de internet Mozilla e nas plataformas LinkedIn, Yelp, Amadeus e Reddit.
Em 2017, o acréscimo do segundo afetou um software da empresa de segurança online Cloudflare, deixando parte dos clientes offline. No início deste ano, alguns sites também foram afetados.
Para os profissionais da Meta, o ajuste de tempo “beneficia principalmente cientistas e astrônomos”, mas deveria ser substituído, diante do caos que traz.
“Estamos prevendo que, se nos atermos ao TAI (Tempo Atômico Internacional), sem observação de segundo bissexto, devemos ser bons por pelo menos 2.000 anos”, afirmou Ahmad Byagowi. Ele quis dizer que, na prática, o dia na Terra não chegaria a perder a sincronia com o Sol sem esse acréscimo.
“Talvez nesse ponto possamos precisar considerar uma correção”, continuou o cientista. Apesar da sugestão, a dupla não chega a defender alguma estratégia prática que de fato substitua o segundo bissexto.
Alternativa do Google
O Google, por exemplo, arrumou uma saída provisória para lidar com o problema: o “mancha bissexto”. Em 2011, eles passaram a distribuir esses segundos extras ao longo de um dia.
“Modificamos nossos servidores (…) internos para adicionar gradualmente alguns milissegundos a cada atualização, variando em uma janela de tempo antes do momento em que o segundo bissexto realmente acontece”, explicou a empresa na época. Assim, quando chegava a hora de adicionar um segundo extra à meia-noite, os relógios do Google já levavam isso em consideração, distorcendo o tempo ao longo do dia.
Solução universal
Com agências governamentais dos EUA e da França no coro dos descontentes, as big techs querem que uma tecnologia mais palatável às máquinas — e aos astrônomos — seja introduzida na próxima década.
A expectativa é que a solução já possa ser apontada no próximo no ano, quando sairá um relatório sobre o tema. O documento foi encomendado pela União Internacional de Telecomunicações da ONU (Organização das Nações Unidas) desde 2015.
*Com informações do The Verge e Cnet.