Finalmente, o Telescópio Espacial James Webb está pronto para fazer ciência. Nesta terça-feira (12), a Nasa divulgou suas primeiras fotos “pra valer”: galáxias remotas, nebulosas brilhantes e um distante planeta gasoso gigante. São as imagens mais nítidas e profundas e do universo em que já colocamos nossos olhos.
Mas isso é só o começo. Com equipamentos supersensíveis e avançados, o James Webb inaugura uma nova era da astronomia. Ele funciona como uma máquina do tempo, que pode enxergar o que aconteceu após o Big Bang, há quase 14 bilhões de anos. Seus dados nos ajudarão a desvendar mistérios da formação do universo e a descobrir novos mundos fora do Sistema Solar.
Entenda o que faz dele tão especial e do que ele é capaz.
Descobertas científicas revolucionárias
Uma maravilha da engenharia, ele é capaz de espiar mais longe no espaço do que qualquer outro telescópio já fez, graças ao seu enorme espelho principal e instrumentos de foco infravermelho, permitindo que sua visão atravesse gás e poeira cósmicos.
Nós sabemos que o Big Bang ocorreu há cerca de 13,8 bilhões de anos, mas ainda não desvendamos como tudo aconteceu desde então. Como a luz das estrelas e galáxias leva muito tempo para nos alcançar, o que vemos nas imagens do Webb, na verdade, é como elas se pareciam há milhares, milhões ou até bilhões de anos — dependendo da distância.
Instrumentos inovadores
O telescópio é equipado com quatro câmeras e espectrômetros. Estes instrumentos são capazes de operar em um total de 17 modos diferentes.
O mais importante e utilizado, provavelmente, é a NIRCam (Near Infrared Camera, ou “câmera de infravermelho próximo”): uma tecnologia de captura de imagens que opera em frequências do espectro visível e invisível, entre 0,6 e 5 µm. Como referência, o olho humano consegue enxergar apenas entre 0,38 e 0,78 µm.
Ela tem o potencial de capturar luz emitida logo depois do Big Bang, inclusive fracas emissões de infravermelho das mais antigas galáxias e estrelas, que só agora estão nos atingindo. Vale ressaltar que os registros são, originalmente, em preto e branco. Depois, são processados com filtros para colorir e aumentar o contraste visual.
Os outros três instrumentos são:
- NIRSpec (Near Infrared Spectrograph, ou “espectômetro de infravermelho próximo”), capaz de revelar a temperatura e composição de estrelas distantes;
- NIRISS (Near Infrared Imager and Slitless Spectrograph ou “sensor de infravermelho próximo e espectrógrafo sem fenda”), para observar planetas ao redor de estrelas brilhantes;
- MIRI (Mid-Infrared Instrument ou “instrumento de infravermelho médio”), para enxergar galáxias distantes ou recém-formadas, além de objetos menores e mais fracos, como asteroides. É o sensor do telescópio que opera no comprimento mais longo de luz, capaz de ultrapassar nuvens de poeira com mais facilidade.
Tecnologia de ponta
Alguns dos maiores telescópios terrestres são feitos com espelhos segmentados, mas o James Webb é o primeiro a usar essa tecnologia no espaço. Seu espelho primário, de 6,5m de diâmetro é fragmentado em 18 peças hexagonais de berílio sólido — um dos metais mais resistentes, estáveis e duráveis. Parece uma grande colmeia refletora.
Por isso, a etapa de calibração e testes demorou cerca de seis meses: era preciso que todos os segmentos estivessem alinhados como se fossem um só, com a precisão de um fio de cabelo humano, para produzir uma imagem unificada da mesma estrela. Missão cumprida com mais que sucesso.
Ele enxerga mais que o Hubble
O James Webb é o sucessor do Telescópio Espacial Hubble. Nos últimos 32 anos, o Hubble foi nosso olho no espaço, mas já sente o peso da idade, apresentando diversas falhas recentemente.
A nova tecnologia não só fará imagens com mais resolução e nitidez, como enxergará coisas nunca antes vistas. O Hubble, com um espelho de “apenas” 2,4m de diâmetro, opera em comprimentos de luz visível e ultravioleta, e apenas uma faixa limitada de infravermelho. Ou seja, o James Webb percebe ondas de luz que são totalmente invisíveis para o antecessor.
Como as ondas infravermelhas são mais longas, é possível ver mais longe e, consequentemente, enxergar o passado. O grande objetivo é registrar as primeiras estrelas e galáxias do universo, além de sondar planetas distantes possivelmente habitáveis.
O James Webb é um projeto conjunto das agências espaciais dos Estados Unidos (Nasa), Europa (ESA) e Canadá (CSA). Ele custou cerca de US$ 10 bilhões (cerca de R$ 55 bilhões) e tem uma “expectativa de vida” prevista de dez anos – mas deve operar por mais tempo.
As imagens já liberadas
De tirar o fôlego, as primeiras fotos apresentadas revelam detalhes nunca antes vistos de cinco objetos muitos distantes (elas podem ser baixadas em altíssima resolução no site da Nasa). São eles:
Nebulosa da Carina: fica a cerca de 7.600 anos-luz da Terra. Uma das maiores e mais belas nebulosas (“maternidades” onde as estrelas se formam), com enormes colunas de poeira e gás. A nova imagem mostra, com riqueza, uma região batizada de “Penhasco Cósmico”, uma paisagem brilhante do nascimento de estrelas.
Nebulosa do Anel do Sul: fica a cerca de 2.000 anos-luz da Terra. É uma imensa bolha brilhante, em formato de “8” (por isso também é conhecida como “Eight-Burst“), ao redor de duas estrelas — gás e poeira são expelidos pela menor, que está morrendo.
Quinteto de Stephan: fica a cerca de 290 milhões de ano-luz da Terra, na constelação de Pegasus. Foi o primeiro grupo compacto de galáxias já descoberto, em 1787, com cinco delas — que se esticam e puxam mutuamente, em uma dança gravitacional.
SMACS 0723: grandes aglomerados de galáxias podem funcionar como uma “lupa cósmica”, ampliando e distorcendo a luz dos objetos que estão atrás deles. Assim, conseguimos enxergar um campo mais profundo, inclusive galáxias extremamente distantes e fracas. Este é o registro infravermelho mais profundo e fiel de objetos espaciais até hoje.
WASP-96 b (espectro): fica a cerca de 1.150 anos-luz da Terra. Um planeta gigante, fora do nosso Sistema Solar, composto principalmente por gás. Descoberto em 2014, ele orbita sua estrela a cada 3,4 dias e tem cerca de metade da massa de Júpiter. A imagem é uma análise de espectroscopia – como um código de barras, que revela a composição química de sua atmosfera.