O campus da USP Butantã, na Cidade Universitária, em São Paulo, será o campo de provas para dois projetos-pilotos de Internet das Coisas (IoT na sigla em inglês) em segurança e mobilidade urbana. Os projetos, que vêm sendo desenvolvidos pelo Laboratório de Sistemas Integráveis Tecnológico (LSI-TEC), serão viabilizados com financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) da ordem de R$ 5,3 milhões.
“A ideia é transformar o campus numa espécie de ‘bairro experimental’ onde serão testadas tecnologias de internet das coisas instaladas em semáforos e em automóveis”, explica o professor Marcelo Zuffo, da Escola Politécnica (Poli) da USP e conselheiro científico-tecnológico dos projetos.
O LSI-TEC é uma instituição de ciência e tecnologia dedicada ao desenvolvimento e inovação em tecnologias avançadas e, nesta iniciativa, que tem o nome de Projeto Cidades Inteligentes, conta com importantes parceiros das iniciativas pública e privada. Recentemente, em encontro realizado na Cidade Universitária com alguns destes parceiros, os cientistas descreveram ao Jornal da USP como serão os primeiros protótipos nas áreas de segurança e mobilidade urbana.
Os projetos utilizarão computadores miniaturizados de projeto nacional, a SBC Labrador do Programa Caninos Loucos, que agregará aos sistemas inteligência artificial de borda e conectividade.
De acordo com o executivo da American Tower, Moisés Silva, que também esteve no encontro, a disponibilidade da comunicação é um dos principais fatores de sucesso da iniciativa e a empresa que ele representa é parceira no fornecimento da estrutura de conectividade sem fio. Márcia Ogawa, por sua vez, destacou que o papel da Deloitte, outra empresa parceira do LSI-TEC na iniciativa, será o de viabilizar o modelo de negócios para que os projetos sejam implantados.
Semáforos inteligentes
Ainda neste primeiro semestre, serão instalados na Cidade Universitária dois semáforos inteligentes. Como explicou a professora Laisa Costa De Biase, coordenadora dos projetos pela LSI-TEC, os semáforos serão equipados com pequenos computadores capazes de processar grandes quantidades de informações. “Os semáforos terão câmeras em seu entorno que captarão imagens, em tempo real, de um determinado raio ao seu redor”, descreveu Laisa.
O semáforo realizará a análise de fluxo de trânsito na região e realizará o controle de abertura priorizando a segurança dos pedestres. “Esta é uma aplicação de computação de borda, na qual um pequeno computador é incluído no semáforo que passa a ser capaz de controlar o momento de abertura e fechamento do semáforo. Ao invés de focar exclusivamente no fluxo de carros, os semáforos propostos no projeto vão priorizar a segurança dos pedestres”, descreveu Laisa.
Hoje, a maioria dos semáforos é programada com uma tabela fixa de tempos de abertura e fechamento. Uma parte dos semáforos, chamados de tempo real, recebem comandos de abertura e fechamento de uma central, na CET. O semáforo inteligente proposto não depende da comunicação para funcionar, por isso é mais robusto – funciona mesmo quando a rede de comunicação não está disponível. Ele controla a abertura e fechamento dos semáforos de maneira dinâmica de acordo com o fluxo de carros e de pedestres medido pelas câmeras.
Laisa informa que a adaptação dos dois semáforos do campus da Cidade Universitária, no Butantã, deverá ser iniciada ainda neste primeiro semestre, mas será feita em fases. “Já temos uma placa de controle com conectividade e com as câmeras. Esta placa está em homologação para poder ser instalada em campo”, descreveu acrescentando que “o processamento de inteligência artificial para controlar o sistema ainda está em desenvolvimento. Esperamos fazer o piloto completo no final do ano, outubro.”
Sentinela
Em outra frente do projeto, que atende principalmente a questão segurança, o LSI-TEC trabalha na construção de um sistema que deverá ser instalado em automóveis. Trata-se do Sentinela, que foi desenvolvido para identificar e notificar situações de risco de vida e ações criminosas a partir de um automóvel.
Um dispositivo é embutido no veículo e faz a leitura das placas dos carros próximos, monitora o ambiente e identifica situações de risco a partir de imagens captadas por uma câmera instalada no automóvel. “Tudo isso usando tecnologias de inteligência artificial”, como explicou Laisa. As notificações são realizadas por mensagem que são encaminhadas a um servidor remoto. O Sentinela tem o tamanho aproximado de uma caixa de bombom.
Segundo o capitão Cauã Sarto Conselheiro, gerente eventual do projeto pela Polícia Militar (PM) do Estado de São Paulo – que também integra a parceria – os eventos serão notificados, de imediato, por meio de comunicação sem fio para um servidor remoto. De acordo com Laisa, há dois automóveis particulares que já estão testando o dispositivo e o sistema de comunicação tem funcionado satisfatoriamente. Os dois carros circulam pelas ruas de São Paulo.
Contudo, os testes pilotos em maior escala serão realizados instalando o Sentinela em carros da PM, como disse ao Jornal da USP o capitão Cauã. A previsão para que as primeiras viaturas tenham o dispositivo, segundo Laisa, será já no segundo semestre. “Preferencialmente, nas viaturas que fazem o patrulhamento no campus da Cidade Universitária”, destacou a pesquisadora.
Caso um veículo equipado com o Sentinela se envolva em um acidente, o equipamento instalado poderá identificar a gravidade e gerar uma ocorrência automática diretamente ao serviço de emergência, sem intervenção humana, gerando socorros mais rápidos e precisos devido à localização.
Os carros equipados com o Sentinela farão o monitoramento dos veículos ao seu redor. Por exemplo, serão analisadas automaticamente as placas dos veículos próximos e, caso estes já estejam cadastrados em bancos de dados como envolvidos em ilícitos, será gerado um alerta para os policiais informando a possibilidade de o veículo ser suspeito. “Tudo isso será feito no tempo médio de até 4 segundos. Isso permitirá socorros mais rápidos e um policiamento mais efetivo.”
Instrumento de política pública
Para o professor Marcelo Zuffo, o projeto atende ao Plano Nacional de Internet das Coisas (IoT). “Utilizamos tecnologias abertas, das quais sempre fui favorável”, explicou Zuffo, destacando que o custo das instalações é muito mais baixo se comparado com outras soluções existentes. “Quer um exemplo de tecnologia aberta? Podemos citar o sistema bluetooth de redes sem fio, por exemplo”, disse o professor.
O projeto foi selecionado na chamada BNDES Pilotos de IoT e será conduzido pelo LSI-TEC. Para a execução dos pilotos foi estabelecida uma rede de colaboração que conta também com o grupo automotivo Stellantis, com a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) de São Paulo, com a Secretaria Municipal de Transportes de São Paulo, com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo em que algumas instituições participam como cofinanciadoras e outras na implantação da solução.
O projeto de Cidades Inteligentes com IoT é extremamente desafiador. A iniciativa engloba aspectos do estado da arte em tecnologia IoT com aspectos relevantes de impacto socioeconômico para a população”, descreveu Zuffo.