Se Charles Darwin explicou como a vida evoluiu, ainda sobrou uma pergunta no ar: como a vida surgiu? As teorias mais populares, religiões e outras crenças à parte, creditam o fato a uma sopa primordial, um relâmpago e um golpe de sorte. Mas e se, em vez disso, a origem e a evolução da vida seguirem as leis fundamentais da natureza?
Em 2013, o físico do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) Jeremy England propôs uma ideia completamente diferente e chocante: ele sugeriu que a vida é um produto inevitável da termodinâmica. Em vez de ser um evento excepcional e raro, ele considera que o desenvolvimento da vida é “tão surpreendente quanto rochas rolando morro abaixo”.
Chamado de “novo Darwin”, England utiliza argumentos de física estatística para explicar o surgimento espontâneo da vida e, consequentemente, a síntese moderna da evolução. O cientista chama esse processo de “adaptação orientada por dissipação”.
A hipótese sustenta que grupos aleatórios de moléculas podem se auto-organizar para absorver e dissipar de forma mais eficiente a energia do meio ambiente. Com isso, ele afirma que tais sistemas auto-organizados são uma parte essencial do mundo físico.
Segundo England, a sua teoria visa ressaltar, e não substituir, a teoria da evolução por seleção natural de Charles Darwin, que oferece uma descrição convincente da vida no nível dos genes e das populações. O físico acredita que, de uma perspectiva da física, a evolução darwiniana pode ser tratada como um caso especial de um fenômeno mais geral.
Quem é Jeremy England?
Jeremy England nasceu em Boston e cresceu em uma cidade universitária em New Hampshire. England obteve um diploma de bacharel em bioquímica de Harvard em 2003. Depois de receber uma bolsa Rhodes, ele estudou no St. John’s College, Oxford, de 2003 a 2005. Obteve seu Ph.D. em física em Stanford em 2009.
Em 2011, ingressou no Departamento de Física do Instituto de Tecnologia de Massachusetts como professor assistente. Em 2019, ingressou na GlaxoSmithKline como Diretor Sênior em inteligência artificial e aprendizado de máquina.
England compartilhou o Prêmio Irwin Oppenheim APS 2021 com Sumantra Sarkar. O físico foi selecionado como Rhodes Scholar em 2003. Também em 2003, a Fundação Hertz concedeu a ele uma Bolsa Hertz.
Teoria
Jeremy England começou a ser notado em 2013 com uma nova teoria que lançou a origem da vida como um resultado inevitável da termodinâmica. Ele vem realizando um par de testes de sua teoria desde então, e seus resultados, publicados na Physical Review Letters (PRL) e no Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), sugerem que ele está certo.
É tudo sobre como as estruturas de átomos inanimados capturam e liberam energia. England está testando sua própria fórmula — que é baseada na física aceita — prevendo que uma coleção de átomos movidos por energia externa, como o sol ou algum tipo de combustível químico, e cercados por calor, muitas vezes se reorganizará para absorver e dissipar cada vez mais energia.
Sob certas condições, os átomos acabarão desenvolvendo as características de troca de calor da matéria viva. E assim, ele diz: “Você começa com um aglomerado aleatório de átomos e, se você iluminar por tempo suficiente, não deve ser tão surpreendente que você obtenha uma planta”.
A chave para sua teoria é a segunda lei da termodinâmica, parte da qual é a ideia de que um sistema fechado como o universo tende a se tornar mais caótico ao longo do tempo, eventualmente se tornando um equilíbrio entrópico indiferenciável.
A IFL Science usou uma analogia simples para descrever o efeito: Pense em uma poça de água com três corantes coloridos jogados nela. Inicialmente, eles permanecem como pontos separados e distantes, mas com o tempo, as cores se espalham, se misturam e, no final, há apenas uma única cor. Esse é o universo; os pontos, neste caso, podem ser bolsões de vida biológica.
England propõe que, em sistemas com influência externa — como, digamos, o sol oferece à terra —, os desequilíbrios de energia podem ser tão complexos que os átomos se reorganizam naturalmente em arquiteturas que podem sobreviver ao caos. As estruturas que eles formam para lidar com a energia podem se parecer muito com as estruturas atômicas dos seres vivos.
O que dizem os experimentos?
Os experimentos retratados na Physical Review Letters (PRL) tinham como objetivo verificar se as partículas podem, antes de tudo, se reorganizar em resposta a uma fonte externa de energia. Com a ajuda dos alunos Tal Kachman e Jeremy A. Owen, o físico modelou um ambiente químico de “brinquedo” de partículas brownianas reativas que foram periodicamente submetidas a condutores externos de energia que forçaram a ocorrência de interações químicas.
Os pesquisadores observaram que as partículas eventualmente buscavam o produto químico necessário para construir uma estrutura de sistema que ressoasse na mesma frequência que o condutor, facilitando assim a absorção mais eficaz de sua energia.
Já os experimentos descritos no Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) foram mais complexos. England e Jordan Horowitz trabalharam com simulações de computador de uma rede química contendo 25 substâncias químicas.
Executando uma série de simulações usando concentrações químicas iniciais aleatórias, taxas de reação e “paisagens forçadas” — conjuntos de fontes e quantidades externas de energia — os pesquisadores queriam ver qual seria o “estado fixo” final das infusões.
Algumas se estabeleceram no equilíbrio entrópico esperado, mas outras simulações, submetidas a ambientes extremos e difíceis, percorreram rapidamente diferentes arranjos no que parecia muito com uma tentativa de chegar à estrutura ideal para absorver e emitir a energia à qual foram expostos. No resumo do artigo, England e Horowitz dizem que isso “pode ser reconhecido como exemplos de aparente ajuste fino”.
Aparição em livro de Dan Brown
Uma versão ficcional de England e sua teoria da “adaptação orientada por dissipação” aparece no romance ‘Origem’ do famoso escritor norte-americano Dan Brown. ‘Origem’ é o sétimo livro de ficção do escritor e o quinto a ser protagonizado pelo simbologista Robert Langdon.
A trama do livro gira em torno de uma descoberta revolucionária, capaz de responder às clássicas perguntas “de onde viemos?” e “para onde vamos?”, assim como a teoria proposta por England.