Se a noite é dos solteiros, o dia 12 de junho é o dos namorados! Apesar de muita gente usar o argumento de que é “apenas uma data comercial” criada pelo pai do ex-governador João Doria, o 12 de junho mobiliza a internet. Não importa se o casal está há um mês, um ano ou uma década junto, a foto do dia dos namorados não pode faltar no Instagram. Ou pode?
Para o azar de nós, solteiros, as redes sociais estão inundadas com fotos de casais felizes e sorridentes, textões com juras de amor eterno, e a chuva de likes vem.
Peço permissão para criar um ditado: na internet, existem dois tipos de pessoas, o “perfil de blogueira” e o “low-profile”, ou seja, alguém que posta até a foto do prato antes de comer e outro alguém que não gosta muito de dar as caras pela internet. Normalmente, o casal moderno, como diz o meme, é formado por um de cada tipo.
Se você, leitor, nunca caiu numa briga sobre postagens nas redes sociais, certamente já ouviu alguma história do tipo e chuto que foi perto de alguma data importante, como este 12 de junho que nos assombra. O muro entre o que é virtual e o que é digital já caiu faz algum tempo, a vida real está nas nossas mãos, dentro de nossas telas de celulares. Também por isso, tem quem se importe, e muito, com uma postagem.
“A decisão de postar uma foto tem a ver com um aspecto do nosso tempo que é a visibilidade”, afirma Issaaf Karhawi, pesquisadora em comunicação digital na USP (Universidade de São Paulo) e autora do livro “De blogueira a influenciadora”, em entrevista ao Sexting. “A gente se organiza socialmente a partir da visibilidade midiática. Para algo ser reconhecido como valioso, precisa tornar-se visível”, explica.
Existe uma espécie de acordo tácito, aquele que não precisa nem ser falado, de que é preciso construir visibilidade na internet. Como dizem, quem não é visto, não é lembrado – e aquilo que é visível, é aquilo que importa. “O sujeito que consegue espetacularizar a própria vida é considerado bem inserido socialmente, bem ajustado, bem-sucedido”, diz Karhawi.
Pode parecer que toda essa lógica social surgiu apenas por causa da internet e das redes sociais, mas é um processo que vem acontecendo há muito tempo. Antes do Tinder e do Instagram, as pessoas mandavam cartas para o jornal para encontrar um amor e anunciar noivados e casamentos. Antes do WhatsApp e do TikTok, tinha quem contratava carro de som para anunciar o amor.
“Vem de um longo processo de subjetivação ao longo de décadas que vai reorganizando a forma como a gente se entende subjetivamente”, explica a pesquisadora. “Se, por muito tempo, questões privadas e íntimas deveriam permanecer na esfera privada, elas são bem-vistas hoje quando são exteriorizadas.”
Ou seja, para além do plano individual, postar ou não aquela fotinho e participar daquela corrente de amor nos stories, tem um pano de fundo social. Assim como se chatear porque o seu amor ignorou completamente o Dia dos Namorados também é uma emoção gerada dentro de um contexto social em que o ato de postar importa, e muito.
Mas e se eu não postar? “É quase um perfil de subversão, uma oposição do nosso tempo”, diz Karhawi. “Um escape do que é mandatório”, completa. Não postar nada, ser “low-profile”, é nadar contra a corrente.
As correntes
Tem quem ache besteira participar de correntes dos stories, mas, para Karhawi, elas são como um passeio no tempo, como voltar aos primórdios da história da internet. “A ideia das correntes é a ideia das comunidades. Vemos pessoas compartilhando a mesma ideia, gostos triviais”, afirma. “Elas reúnem tudo o que é fundante na internet, muito distante dos discursos de ódio, da polarização.”
A internet, opina a pesquisadora, é um espaço para práticas cotidianas, não apenas autopromoção do trabalho ou fotos de look de blogueirinha, mas sim para relações sociais mais genuínas, já que faz parte da nossa rotina. Indo além, a internet é, também, um lugar de amor.