Quando você coloca um arquivo “na nuvem”, ele geralmente fica disponível apenas pela internet, sem ocupar espaço da memória do seu dispositivo, seja celular ou computador. Mas onde fica essa nuvem? Para onde vai um arquivo armazenado lá?
Em tecnologia, a definição de “nuvem” pode parecer obscura, mas, basicamente, é um termo utilizado para descrever uma rede global de servidores.
A nuvem não é uma entidade física, mas uma vasta rede de servidores remotos ao redor do globo que são conectados e operam como um único ecossistema.
Tampouco, ao contrário do que o nome sugere, essa nuvem não fica pairando no céu, sobre nossas cabeças.
Só a Amazon, por exemplo, tem mais de 2 milhões de servidores ao redor do mundo, segundo o site The Conversation.
Onde fica a nuvem?
O país que realmente pode levar a coroa de “dona da nuvem” é a Irlanda. Muitas companhias têm seus servidores por lá. Na época da instalação das empresas, o local havia sido escolhido por uma série de fatores, como terras baratas e impostos mais baixos.
Para se ter uma ideia, até o ano passado, as big techs instaladas na Irlanda poderiam pagar impostos pelo menos 11% mais baratos do que se estivessem em países como Inglaterra, Alemanha e França. Em alguns, a diferença chegava a mais de 20% no valor dos impostos cobrados.
Com a proposta do imposto global mínimo de 15%, essa configuração pode ser alterada nos próximos anos.
Ainda na União Europeia, outro país que se destaca é a Alemanha. As regulamentações de proteção de dados vigentes no país obrigam as empresas a manterem as informações dos cidadãos alemães em território nacional.
Nas Américas, os EUA são um nome forte por serem berço das principais empresas de tecnologia e lar das principais inovações do setor. O Brasil também tem um número considerável de servidores e datacenters de nuvem, servindo como um hub para a América Latina.
Na Ásia, o Japão se destaca por motivos parecidos com os dos EUA. Singapura também apresenta peso considerável no setor por oferecer tributação competitiva para as empresas. Outro destaque é a China, que tem presença muito forte de servidores e datacenters de empresas do próprio país, como Alibaba e Huawei.
Nos próximos anos, alguns países que devem apresentar crescimento nesse setor são Argentina e Chile, para América Latina; Turquia e Grécia, para União Europeia e Oriente Médio; e África do Sul, para o continente africano.
Onde estão meus arquivos?
Os arquivos de usuários brasileiros do Office 365, o pacote de aplicativos em nuvem da Microsoft (como Word, Excel e PowerPoint) ficam distribuídos entre EUA, Chile e, desde 2014, o próprio Brasil.
“O Brasil está entre as 44 regiões por onde estão distribuídos os mais de 100 datacenters da Microsoft — é o primeiro da América Latina e do Hemisfério Sul. Vale ressaltar que, na época que inauguramos nosso datacenter no Brasil, aumentamos de 10 a 30 vezes a velocidade dos serviços para clientes brasileiros”, segundo a empresa.
Já os servidores do Google Cloud Platform (GCP), onde ficam seus arquivos do Google Drive, Gmail, Google Fotos e Google Docs, estão hoje nos EUA, Canadá, Brasil, Inglaterra, Bélgica, Alemanha, Holanda, Índia, Singapura, Taiwan, Japão e Austrália.
Quando o Google inaugurou servidores em São Paulo, em 2017, o tempo de resposta (a diferença entre você clicar em algo no seu dispositivo e a ação ser executada) para usuários caiu entre 80% e 95%. Esse é um ponto importante em ter os servidores próximos de quem acessa os dados.
Outra gigante do setor é a Amazon, com sua subsidiária Amazon Web Services, que faz o armazenamento em nuvem de arquivos de milhares de empresas ao redor do mundo, incluindo aquelas que fazem muitos dos apps que você usa no seu celular — do WhatsApp à Netflix.
“A AWS trabalha com o conceito de Regiões, contando atualmente com 18 no mundo. Cada região tem, no mínimo, três zonas de disponibilidade, e cada zona de disponibilidade tem pelo menos um datacenter”, conta a empresa. “Na América Latina, temos a região São Paulo, que é localizada no Brasil.”
O que atrai a nuvem
Vários fatores podem atrair servidores e clientes para um determinado país ou outro. Para quem busca, o dinheiro pode falar mais alto. Muitas vezes, para uma empresa, é melhor contratar um serviço nos EUA porque o preço é menor, mesmo pagando em dólar.
Para quem vai construir um servidor próprio, sem usar a nuvem de outra empresa, vários outros elementos entram na conta.
Questões relativas aos custos de manutenção de grandes servidores, ao regime regulatório existente no país (em termos de proteção de dados e de tributação) e até ao clima (países com temperaturas mais amenas são preferíveis) podem pesar na decisão.
Ronaldo Salvador, engenheiro de computação e analista de redes, destaca a questão da energia como um fator limitante em território brasileiro. “Aqui, não dá para contratar energia de dois fornecedores, o que faz com que os datacenters brasileiros fiquem limitados ao chamado Tier III.”
“Não quer dizer que são ruins, pois muitos têm seus geradores para garantir o fornecimento em caso de falta de energia, mas não podemos oferecer as condições de resiliência para um grau IV ou superior, como acontece lá fora.”
A questão do clima é importante, pois diminui os gastos com resfriamento dos servidores — quanto mais quente um país, mais difícil e caro se torna esse processo. É tão importante que a Microsoft colocou em 2015 um tubo de aço com servidores para funcionar no fundo do mar, próximo à costa da Califórnia. Assim, as próprias temperaturas baixas dispensaram o uso dos sistemas de resfriamento.
A segunda perna desse projeto aconteceu em junho de 2018, com a instalação de um novo datacenter submarino na costa da Escócia. Além de todos esses elementos, a latência tem papel fundamental na escolha.
Mas, para especialistas, a principal questão é mesmo a velocidade. O tempo de latência é cada vez mais importante. Se você pensar em internet das coisas (Iot), como lâmpadas e geladeiras conectadas, por exemplo, estas são aplicações que não precisam de muita banda, pois transmitem poucos dados, mas precisam de baixo tempo de latência, pois exigem respostas rápidas.
Assim, é preciso escolher um local que ofereça a latência mais baixa possível.
Privacidade e segurança
Se os servidores com as informações não estão no país de quem é dono delas, como ficam questões de privacidade e segurança de dados?
Em geral, via de regra, aplicam-se a dados armazenados na nuvem a legislação do país em que estão localizados os dados. Mas essa regra não evita nem resolve eventuais conflitos de natureza transnacional, segundo especialistas.
Uma iniciativa que busca explicar como cada empresa lida com essas questões de privacidade é a página “Who Has Your Back”, da Electronic Frontier Foundation (EFF), que avalia diversos aspectos dos serviços de armazenamento em nuvem.
Outra legislação nesse campo é o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) da União Europeia, que entrou em vigor em 25 de maio de 2018. Ela é avaliada como a legislação mais avançada do tipo e tem forçado diversas empresas a mudar seus termos de uso.
No Brasil, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que entrou em vigor em 2020, exige que as empresas com atuação por aqui armazenem dados de brasileiros em servidores locais, ou em países com legislação semelhante à nossa.